TEMA: AMORES FAST FOOD
*Tela de René Magritte
- Os amantes (1928).
“Relacionamento” é o tema quente
do momento e o tópico mais mencionado nas redes sociais. Alguns usuários alardeiam
sua sorte com fotos e frases extraídas de rodapés de papel de carta ou excertos
poéticos de obras que jamais tencionaram ler na íntegra. Enquanto isso, outros
espalham suas lamúrias e fazem do universo virtual uma espécie de confessionário
ou divã. É uma verdadeira “overdose” de sentimentalismos que, longe de mostrar
uma maior pré-disposição para o amor, apenas evidencia quão frágeis são os
laços que unem afetivamente as pessoas.
Nesse contexto, é cada vez mais
comum a ocorrência dos chamados “amores fast food”. Grosso modo, chamamos de
fast food as comidas rápidas às quais as pessoas recorrem diante da
impossibilidade de uma refeição adequada e que, na maioria das vezes, estão
repletas de calorias. São “paliativos alimentares”, que nos dão a falsa
impressão de saciedade. Entretanto, se avaliarmos seu teor nutricional, veremos
que pouco ou nada foi acrescentado ao nosso organismo.
Pois bem... Assim parecem os
romances atuais. Supostamente intensos e, na essência, pouco significativos. Atenuam
a solidão, mas estão muito longe de confluir paixão, intimidade, companheirismo
e união. O amor é, hoje, um sentimento “plastificado”, gerido por conveniências
e com obsolescência programada. Resultado: é cada vez mais difícil manter um
relacionamento a longo prazo e os níveis de insegurança afetiva crescem a cada
dia.
Confesso que fico assustada diante de indivíduos
que, após um breve período de namoro, chamam seus pares de “vida”, escrevem
declarações das mais exacerbadas (de alguns murais “pingam” sangue, suor e
lágrimas) e fazem questão de tirar fotos de cada momento do casal (inclusive
dos mais íntimos) para divulgar no Instagram. Não basta estar apaixonado, tem que mostrar na
net e assim sambar na cara daqueles que permanecem solteiros. É uma estranha
necessidade de exposição que se prolonga até mesmo diante do término. Há perfis
que podem ser acompanhados como folhetins. Lendo as atualizações sabemos de
cada lance emocionante das epopeias amorosas alheias.
Não há espaço para imperfeições e
dúvidas. Se o relacionamento não funcionar a contento, basta trocá-lo por
outro. Afinal, indivíduos disponíveis existem aos montes em todos os lugares.
Há ainda espaços que são verdadeiras vitrinas de solitários. Casas de shows,
bares e festas feitas especificamente para solteiros. Basta frequentá-las,
avaliar seu público (como mercadorias) e escolher aquele (a) que melhor se adequa
às suas necessidades. É o sucateamento do amor. Não serve? Já não me satisfaz?
Vai para o lixo! Simples assim.
“Eu te amo” vem sendo usado
indiscriminadamente. Eis a chamada “lei do desapego”. É como proclama o refrão de
uma canção homônima: “Eu
tô pegando mesmo/ Tô praticando a lei do desapego/ Que diz que não preciso me
apaixonar/ Pra ser feliz eu não preciso me entregar”. E, enquanto
letras assim são cantadas a plenos pulmões por multidões de solitários, a
lírica camoniana e a crença na validade do amor permanecem apenas nas mentes de
poucos esperançosos vistos pela maioria como iludidos ou sonhadores.
Pobres
daqueles que imaginam que a maior rotatividade de parceiros é uma eficaz
estratégia de autopreservação! Evitar
uma relação estável e duradoura não o torna imune ao amor ou ao sofrimento
que dele pode advir. Isso irá aprisioná-lo no vazio universo dos prazeres
esporádicos e as relações ocasionais jamais permitirão uma real compreensão do
que é expor o coração a nu. Garantias jamais existirão e, se o medo barrar a
sua entrega, siga o conselho do escritor português José Saramago: entregue o
assunto ao governamento da sensibilidade e ela, melhor que a inteligência
racional, saberá proceder segundo o que mais convenha à perfeição dos instantes
seguintes.
(Ana Paula Bacelar, 27/01/2013)


