segunda-feira, 20 de maio de 2013

CRÔNICAS DE UMA CEARENSE EM GYN (PARTE XIV)



EPISÓDIO DE HOJE: COMO CONVERTER O WOLVERINE EM TOY STORY

Cerca de duas semanas atrás, depois de levantar resignada para mais uma odisseia proletária, segui no alto da minha ankle boots para mais um típico dia repleto de sintaxes e correções. Depois de estacionar meu possante na quadra onde está localizado o centro do saber no qual exerço meu papel como base da pirâmide social, eis que um movimento estranho chamou minha atenção. 

Guiando uma motocicleta (negra como as intenções que nutria) um ser de conduta suspeita (vulgo “meliante”) diminui ameaçadoramente a velocidade quando me avistou portando uma maxi bolsa rosa pink digna do mais nobre catálogo da Carmen Steffens. Sua expressão mudou e os olhos ganharam o brilho atroz da ganância. Imediatamente tomei uma resolução: ele não furtaria o item mais flúor da minha coleção pessoal. Saí em disparada, saltos ecoando no asfalto da manhã. 


Num lance de absoluta covardia, o dito safardana avançou em minha direção a fim de me atropelar e assim minar qualquer resistência. Nos breves instantes que seguiram, a vida passou diante dos meus olhos como um filme (hollywoodiano, claro, Afinal, se tratando da MINHA vida não poderia ser diferente). Fui lançada ao chão e senti as unhas do delinquente rasgando a minha carne para arrancar o artigo de tão árdua disputa. Mesmo ciente dos riscos, munida da coragem nordestina herdada de meus ancestrais do cangaço (da espécie conhecida taxonomicamente como Homo virgulinus sapiens arretadus), resisti bravamente e, depois de várias tentativas frustradas, o marginal lançou um intimidador olhar que foi por mim retribuído com o mesmo nível de hostilidade. Aproveitei uma breve vacilação e corri (não sem antes ostentar para meu adversário o ar de superioridade típico daqueles que alcançam a vitória). 


Ainda hoje tenho as marcas do Wolverine nos braços, mas estou certa de que fiz valer o que escreveu Euclides da Cunha: “O nordestino é, antes de tudo, um forte”. Para o fascínora usurpador de bens peruísticos alheios, diria (se oportunidade houvesse): evite confrontar os herdeiros de Lampião. Quando a cabeça da vítima em potencial for chata, volte duas casas e tente outra vez. Afinal, como sabiamente proclamou Patativa do Assaré, somos filhos do Nordeste, somos cabras da Peste, somos do Ceará. Por fim, em bom cearês: “Não bote boneco, num se bula, nem faça mugango...Se me arreliar já sabe: arranco o chaboque do dedo, enfio a peixeira no bucho e boto o fato pra fora, seu mundiça!”. Entendeu ou quer que eu desenhe riscando com a faca no concreto? Ôxe!



(ANA, 20/05)

domingo, 19 de maio de 2013

ALÉM DO VÉU



Desperdiçamos tanto sentimento com aqueles que não estão dispostos a recebê-lo, que, muitas vezes, nos sentimos exaustos, drenados e fatalistas diante do futuro. Passamos a visitar costumeiramente o limbo onde jazem nossos amores mortos, choramos novamente as lágrimas da perda e cobrimos o rosto e o coração com as negras vestes da viuvez. Entretanto, mesmo o mais lastimoso réquiem² precisa findar um dia.

A vida não se alimenta da morte e a felicidade tampouco pode ser nutrida pelas frustrações e dores advindas de histórias que já pereceram. Devemos reconhecer o momento de ir, de deixar para trás aquilo que já não reluz. A esperança há de transparecer sob o véu da desilusão. Afinal, as lembranças de momentos vividos ocupam a mente, mas não preenchem um coração. Que não sejamos, pois, cadáveres vagando sem norte por uma existência perdida.
(Ana, 19/05)

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Polêmica no ar: Bolsa Crack



Resolvi participar de um fórum de debates sobre a criação do Cartão Recomeço (apelidado Bolsa Crack). Mesmo reconhecendo um sem-número de ressalvas no projeto, confesso que fiquei estarrecida com as declarações feitas pelos participantes. Por isso, faço questão de transcrever as “pérolas” e as considerações que fiz diante de cada uma delas. 
PÉROLA 1: “VÃO FAZER FESTA DO APÊ COM O DINHEIRO DOS NOSSOS IMPOSTOS”.
Para os censores tributários de plantão vale um esclarecimento: o dinheiro não será dado ao usuário ou à sua família. O repasse ocorrerá do cofre público para as instituições de cadastradas, que serão fiscalizadas continuamente. Não tem caráter de “renda”, logo não deve ser desviado da sua finalidade.
PÉROLA 2: “ACHO INJUSTO. OS CIDADÃOS DE BEM SOFRENDO E ESSES DROGADOS GANHANDO BOLSA ‘NO MOLE’ DESSE JEITO?”

O Poder Público não está premiando o vício, mas sim fazendo valer o seu papel na assistência à população. Afinal, as verbas públicas não são destinadas apenas aos “homens de bem” (categoria utópica cada vez mais esvaziada, já que resulta da autopromoção hipócrita da qual se valem aqueles que desejam estabelecer uma clara distinção valorativa em relação ao outro). O direito à dignidade humana deve existir para todos e cabe ao governo, em suas mais distintas instâncias, promover as condições para que a cidadania seja vivenciada em sua plenitude.

PÉROLA 3: “NÃO VAI ADIANTAR NADA”.
Obviamente, a desintoxicação é apenas o começo. O projeto tem caráter emergencial e não excluí a necessidade de mais investimentos no combate ao tráfico, bem como a criação de programas de profissionalização e reinserção no mercado de trabalho (para diminuir os índices de reincidência) e um acompanhamento familiar a fim de que o indivíduo persista sem retornar ao vício.
PÉROLA 4: “PENSO QUE ISSO É UM ABSURDO. A PESSOA ESTÁ NESSE MUNDO POR QUERER. ESCOLHA DELE, ENTÃO QUE SE CUIDE”.
(Se essa lógica imperasse, deveriam ser entregues à própria sorte aqueles que tentaram suicídio já que eles escolheram abrir mão da própria vida, certo?). Precisamos reconhecer que a dependência química é uma DOENÇA progressiva e potencialmente fatal. Além da devastação física e emocional, os usuários de drogas têm mudanças de comportamento que podem levá-los à insanidade e à práticas criminosas. É considerada multifacetada, pois atinge o indivíduo em corpo, mente e espírito. Ainda que a primeiro contato com a droga seja uma questão de escolha, a condição de vulnerabilidade do usuário frente ao vício exige uma intervenção externa e um tratamento contínuo e oneroso (que muitas famílias não têm condições de custear).
PÉROLA 5: “VOU COMEÇAR A USAR UMAS PEDRAS, TÁ LOUCO? 1.350 PILAS POR MÊS!
Não é necessário usar “umas pedras”. Afinal, nessa fala há um claro exemplo de uso do ópio mais alucinógeno de todos: a ignorância.
Por fim, a intervenção mais insólita... E o troféu “Anta de Ouro” vai para:
“ELES (os pobres) VÃO TER FILHOS E DROGÁ-LOS DE PROPÓSITO”.
------ Hãm? Acuma? #chocada
Saí então temporariamente da discussão para resguardar um pouco da minha crença no bom senso alheio... Mais tarde tem mais!

quarta-feira, 1 de maio de 2013

CRÔNICAS DE UMA CEARENSE EM GYN - PARTE XIII


Episódio de hoje - Lombada: o abstêmio! 



No ano de 2013, foi regulamentada a resolução 432/13 (nova lei seca) e a comoção gerada pela tal “tolerância zero” pôde ser percebida nos mais recônditos cantos de Goiânia. Enquanto taxistas e abstêmios de plantão ostentaram o mais largo sorriso, donos de bares e papudinhos¹ em geral se entregaram ao derradeiro porre, ainda inconformados com a ideia de abrir mão da dose costumeira (para alguns, diária) de derivados da cana...

Visando cumprir sua função social e tendo em vista a condição de plena cidadania da qual goza, André Lima (vulgo “o lindo”), fiel escudeiro das Blondes, resolveu testar a eficácia da fiscalização empreendida pelos órgãos competentes. Para tanto, disfarçado de meliante nosso amigo adotou uma postura propositadamente suspeita.

Enquanto guiava sua pick-up, o destemido cidadão ligou o som no mais alto volume e enquanto escutava uma digna sequência de músicas sertanejas, saiu à caça das “blitzes” goianienses. Depois de vinte minutos da mais árdua busca, encontrou a primeira barreira nos arredores da Beverlyn Hills (destino costumeiro da high society). Apesar da poluição sonora, não foi barrado (teve inclusive a impressão de ter visto um dos guardas balançando a cabeça ao som do Bará Berê).

A decepção o dominou, entretanto, seguiu intrépido. Mudou a trilha e associou um elemento ainda mais incriminador: uma latinha vazia no painel do carro. Mais uma vez atravessou incólume a segunda barreira. O mesmo ocorreu na terceira e na quarta. No auge do desespero, pôs a cabeça fora da janela e gritou "pegadinha do malandro". Um guarda sorriu e o deixou seguir (provavelmente para premiá-lo por ter alegrado uma tediosa rotina de trabalho). O consciente motorista (que durante toda a noite cuidou apenas de beber água e suco para hidratar o organismo), falhou no seu intento de comprovar a própria sobriedade e, assim, figurar como garoto-propaganda do Detran nas redes sociais.

Fez-se, pois, verdade o pensamento de Elanklever: “O preço da confiança, é ser veladamente o primeiro suspeito”. Em outras palavras, não raras vezes quanto mais incriminadora é a sua postura, menor é o risco que você parece oferecer. Aprendeu, André Lima?

1. Papudinho - Maneira como o cearense chama a pessoa que bebe muito.
-Lá vem o papudinho, não consegue nem ficar em pé !

Minha trilha...






De nada adianta tentar tornar menos íngreme o caminho. Afinal, há passagens do percurso que, mesmo arriscadas e distantes da chegada, despertam em nós o desejo de andar em círculos indefinidamente. Além disso, as perdas longe de tornarem leve a bagagem apenas nos fazem questionar se vale a pena percorrer até o fim. Digo, pois, convicta: trilharia descalça e de bom grado o mais pedregoso terreno se hoje pudesse mudar a rota do destino e ter de volta o que ficou pela estrada... Resta-me apenas seguir caminhante, quebrando pedras, resistindo aos espinhos e desviando dos perigosos atalhos, mesmo vacilante e a trôpegos passos. Pessoa¹, é chegado o tempo da travessia! 
(Ana, 19/03/2013)

Ameno dori me





O momento mais difícil não é o da perda,
E sim o instante seguinte,
Quando procuramos, não encontramos
e enfrentamos a realidade de que nunca mais teremos!

(Ana, 14/03/2013)

Abandone ilusões. Arquitete realidades.







Não é incomum enaltecermos pessoas medíocres e darmos à histórias falidas e obsoletas as vestes de nossos devaneios. Deixamos que a ilusão obscureça nosso discernimento e alicerçamos sonhos em terrenos movediços. A ânsia pela perfeição do que buscamos é tão intensa que, mesmo diante do desvendamento da verdade, nos rendemos a um apego teimosamente persistente. 
Um dia, contudo, o encantamento se desfaz. Passamos a ver a pequenez e o vil caráter daquele que antes era o detentor da nossa cega paixão. Eis o momento da epifania. É chegado o instante da libertação. Não lamente os projetos não realizados. Sinta-se grato à Providência Divina. Afinal, como sabiamente enunciou o poeta francês Sébastien-Roch Chamfort: "o prazer pode apoiar-se na ilusão, mas a felicidade repousa sobre a realidade..." 


Nem Chapeuzinho Vermelho, nem Lobo Mau




Diante do nosso mundinho maniqueísta e hipócrita, todos querem ser nobres. Pregam o altruísmo, reafirmam suas raízes e "vomitam" virtudes como se a mera menção de princípios os tornasse reais. Você esbarra na superfície de gente assim e pensa ter encontrado alguém raro. Entretanto, já adverte a sabedoria popular "nem tudo que reluz é ouro, nem tudo que brilha é diamante". Desconfie de pessoas boas demais, simpáticas ao extremo, benevolentes até a última instância. Não são normais (nem reais) personalidades "redondas', uniformes, transparentes e puras.

Não sugiro com isso que sejam escamoteadas qualidades, tampouco prego a inexistência da solidariedade humana. Apenas alerto para o falseamento reinante e a proliferação de criaturas excessivamente virtuosas. Não defendo a descrença e sim a prudência.

Afinal, o verdadeiro bom-caratismo não precisa ser alardeado. Ele emana das ações e pronto. E vou além: quem associa a própria imagem à bondade, mas não a pratica NÃO É BOM! Simples assim. Não esqueçamos que, como bem enunciou Shakespeare, até mesmo o diabo pode citar as Escrituras quando isso lhe convém. (Ana) 

Para bellum*





Pensava (erroneamente) que um campeão era aquele que colecionava conquistas e burlava adversidades. Hoje sei que a verdadeira vitória resulta muito mais da capacidade de transformar perdas em pedaços vivificados de fé. Os melhores combatentes não ostentam armaduras bem lustradas, tampouco estão constantemente de armas em punho. Os corajosos enfrentam a vida de peito nu e insistem em acreditar mesmo quando as probabilidades sugerem a impossibilidade do êxito. 

Grandes guerreiros desprezam o medo, mas conservam a prudência; lamentam as perdas, entretanto reconhecem o momento de enxugar as lágrimas e inaugurar novas batalhas; não subestimam os adversários, contudo sabem que acima das forças adversas está a estranha capacidade de regeneração que apenas os espíritos fortes possuem.

Aprendi, por fim, que, muitas vezes, sedimento minha ruína, subestimo minhas potencialidades e boicoto projetos por receio das falhas que possa vir a cometer. Sou, portanto, minha própria inimiga. Sempre temi os golpes. Agora tenho orgulho das minhas cicatrizes. Uso, pois, as dores para compreender a dimensão da minha força e evito lutar por quem não merece o risco e o desgaste do combate.

(Ana, 29/04)

*Referência o provérbio "Si vis pacem, para bellum" (se quer paz, prepare-se para a guerra), do autor latino Publius Flavius Vegetius Renatus.

Na "vibe" Tedesco!



Antes de encarar qualquer problema, fique frente a frente com você mesma. Veja mais do que´o reflexo do seu espelho pode projetar. Reconheça, além da sua imagem, a mulher virtuosa, divertida, inteligente e articulada que Deus criou e que aprimora dia a dia. Personifique um modelo de superação. Faça o que ninguém vai poder fazer no seu lugar: AME-SE SEM RESERVAS! Porque você merece ser absurdamente feliz (e será). Mesmo que o percurso pareça difícil e as expectativas, por vezes, desanimadoras. Garota, ponha seu melhor vestido, escolha o mais digno salto, passe um batom vermelho, ostente um indefectível sorriso e repita como um mantra: "cara, eu sou gata pra caramba!" Saiba que sua capacidade e força são infinitamente superiores a quaisquer adversidades que surjam. Vista a sua armadura, mas não endureça o seu coração. Afinal, como proclama a máxima freudiana, somos de carne, mas devemos viver como se fôssemos de ferro. Seja firme. Enxugue as lágrimas. Erga a cabeça. Mantenha a fé. O medo é o inimigo... Vença-o!
(Ana, 22/04)